A situação de todo o rio Tejo, e
agora especialmente da sua cabeceira, é insustentável. Esta situação resulta de
muitos anos de gestão irracional, liderados por pressões e interesses de outras
bacias (como os dos utilizadores das águas do transvase Tejo-Segura), que somam
um impacto exorbitante e injusto às pressões próprias de que a bacia do Tejo já
padece: descargas de águas residuais da maior concentração humana e industrial
da península, extrações de irrigação e abastecimento, as centrais
hidroelétricas e nucleares, as extrações e descargas ilegais, a ocupação do
domínio público hídrico, a proliferação de espécies exóticas, etc. No entanto,
no Tejo a existência do Transvase Tejo-Segura condiciona toda a gestão do rio e
impede que se tomem as medidas necessárias para inverter a sua deterioração e
melhorar o seu estado. Esta gestão privou todos os cidadãos do Tejo e as suas
povoações ribeirinhas de um património ecológico, social, cultural,
paisagístico e económico de primeira ordem como é o Tejo e o resto dos rios
desta bacia.
A água das barragens da cabeceira
do Tejo deveria ser chave para garantir os usos no início do Tejo, e o seu bom
estado ecológico. No entanto, as barragens de Entrepeñas e Buendia encontram-se
atualmente abaixo de 14% da sua capacidade, enquanto na bacia do Segura as
barragens se encontram a 44% da sua capacidade. Apesar deste contraste, nos
últimos meses, o Ministério da Agricultura, Alimentação e Ambiente continuou a
aprovar transvases desde a cabeceira do Tejo (agora transformado no "Mar
de Aral de Castilla") para a bacia do Segura, tendo-se transvasado 155 hm3
durante este ano hidrológico (1 de Outubro 2014 - 1 outubro 2015), e
autorizando-se a venda de 9 hm3 adicionais de água por parte das comunidades de
regantes de Estremera e a Poveda no Tejo a regantes do Segura.
O novo Plano Hidrológico do Tejo
(período 2015-2021), cuja aprovação está prevista para dezembro de 2015, é o
culminar desta gestão e planeamento irracional, que continua a contemplar o
Tejo e os seus afluentes como meros recipientes de água para vender, transvasar
e usar. Este novo plano assume servilmente a perda de prioridade da bacia do
Tejo e dos seus cidadãos para o transvase Tejo-Segura, apesar de ser
reconhecida essa prioridade por lei. Também pressupõe que o Tejo e seus
afluentes não vão ter regime de caudais ecológicos obrigatório até 2027 (na
melhor das hipóteses), mantendo tanto os irrisórios caudais mínimos do plano de
98 e da legislação do transvase, aprovada sem estudos científicos que os
sustentem e condenando o Tejo e seus afluentes ao longo de décadas. Não há
Diretiva Quadro da Água para a bacia do Tejo, nem se aplica uma nova política
europeia da água aos nossos rios, prisioneiros de uma gestão hídrica enraizada
em postulados do século XIX.
Em protesto contra esta situação
muitos grupos e comunidades, vilas e cidades da bacia do Tejo, em Espanha e
Portugal, unidos na Rede de Cidadania por uma Nova Cultura da Água no Tejo/Tajo
e seus afluentes (www.redtajo.es) convocaram hoje, dia 26 de Setembro de 2015,
concentrações em diversas localidades da bacia, para mostrar a sua indignação e
exigir uma gestão desta bacia que contemple o valor ambiental e social do Tejo
e seus afluentes e tenha como objetivo não deteriorá-lo ainda mais, protegê-los
e recuperá-los como RIOS VIVOS para toda a cidadania.
Como consequência a cidadania da
bacia do Tejo / Tajo manifesta:
- Rejeitamos a atual redação da
proposta de Plano Hidrológico do Tejo para o período 2015-2021. Esta proposta
dá continuidade à péssima gestão do rio expressa no plano de bacia atualmente
em vigor (RD 270/2014 de 11 de Abril), que está em recurso pelos grupos da Rede
junto dos tribunais espanhóis e denunciado perante a Comissão Europeia.
- Consideramos que o transvase
Tejo-Segura é uma obra desatualizada, inviável no contexto das alterações
climáticas em que as entradas de água na cabeceira do Tejo já diminuíram em
47%. O transvase não pode continuar sendo uma servidão perpétua para a bacia do
Tejo. Na bacia do Segura há água de sobra para beber se se respeitar a
prioridade de uso para abastecimento já que mais de 80% dos recursos são
destinados à irrigação. Existe, além disso, uma ampla capacidade de geração de
água com dessalinizadoras que foram em grande parte financiadas com fundos
europeus. Se o preço da água dessalinizada é muito superior ao preço da água do
transvase (que é fortemente subsidiado), e demasiado elevado para o
agronegócio, este não é um problema que deva continuar a ser assumido pela
bacia do Tejo, sendo que se devem encontrar canais políticos de resolução.
- O Plano Hidrológico do Tejo
pendente aprovação considera o Transvase Tejo-Segura e a regulamentação
derivada do Memorando do Tejo (primeiro as disposições finais da Lei de Impacto
Ambiental e, na sequência do acórdão do Tribunal Constitucional, as da Lei
21/2015 de Montes) como um condicionante prévio ao processo de planeamento.
Assim, o Plano contribui para que as necessidades da bacia do Tejo percam a
prioridade que a lei lhes outorga sobre os possíveis transvases. Assim,
distorce-se o processo de planeamento hidrológico no Tejo, que já não tem a capacidade
para determinar os supostos excedentes de água transvasáveis nem o regime de
caudais que devem circular pelos seus rios. Desta forma infringe-se a normativa
europeia e estatal em matéria de proteção da água, planeamento hidrológico,
avaliação ambiental, participação pública e proteção e gestão dos habitats
naturais e das espécies dependentes da água.
- Denunciamos a situação do rio
Tejo na Estremadura, um rio artificializado que perdeu a sua dinâmica natural
por estar submetido a um forte aproveitamento hidroelétrico e à gestão da
central nuclear de Almaraz. Isto traduz-se na chegada a Portugal de caudais
muito limitados - acordados na Convenção de Albufeira e turbinados segundo a
conveniência hidroelétrica – e contaminados, que são lesivos para o Tejo em
Portugal.
Por tudo isto, as cidades,
povoações e movimentos de cidadania de quatro Comunidades Autónomas (Madrid,
Castilla-La Mancha, Castilla y León, e Extremadura) e dois países, Espanha e
Portugal, unimo-nos para defender conjuntamente o rio Tejo e a sua bacia, e
exigimos:
- O estabelecimento no Tejo, e
TODOS os rios da bacia, de um regime obrigatório de caudais ecológicos real que
permita recuperá-los como Rios Vivos e ambientalmente saudáveis para todos os
cidadãos, mantendo ao mesmo tempo o importante papel ecológico, cultural,
paisagístico, económico e social que desempenham. Especificamente, exigimos o
estabelecimento de um caudal mínimo ecológico no rio Tejo de, pelo menos, 11,74
m3 / s em Aranjuez, 23 m3 / s em Toledo e 27,82 m3 / s em Talavera de la Reina,
com uma variação temporal semelhante à do regime natural.
- O encerramento do transvase
Tejo-Segura cuja permanência e novo regime de exploração (referido na
regulamentação derivada do Memorando) não permite a recuperação do rio Tejo.
Enquanto isso, exigimos a imediata paralisação da atual campanha de transvases
e a recuperação dos volumes de água na cabeceira do Tejo até níveis que
garantam as necessidades sociais e ambientais das povoações ribeirinhas.
- Melhorar o tratamento de águas
residuais em toda a bacia do Tejo, e, muito especialmente, as da Comunidade de
Madrid que chegam à parte central do Tejo através do rio Jarama, a jusante de
Aranjuez.
- Uma exploração hidroelétrica na
Estremadura que permita a chegada a Portugal de um regime adequado de caudais
ambientais em Cedilho e que se reduza e elimine a contaminação de todo o tipo
no rio Tejo, incluindo a radioativa.
- Melhorar a gestão do rio na
parte portuguesa da bacia e exigir ao governo português um controlo efetivo
sobre a poluição da agricultura, indústria, suinicultura, águas residuais
urbanas e outras descargas de efluentes não tratados, e o estabelecimento de
regimes de caudais ecológicos reais e efetivos nos rios portugueses da bacia do
Tejo.
Bacia do Tejo/ Tajo, 26 de Setembro
de 2015
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