quarta-feira, 25 de abril de 2012

Não foi para um Portugal assim que se fez o 25 de Abril!




Carla Rodrigues (foto de Eduardo Barrento)
Esperava-se muito da revolução. O povo queria, com todo o direito, melhores condições de vida e um futuro melhor para os seus filhos e por isso aderiu de alma e coração aos ideais do Movimento das Forças Armadas, na esperança de que com novas pessoas e outro sistema político as coisas evoluíssem no sentido de serem criadas novas oportunidades, de uma mais justa distribuição da riqueza.

Estamos hoje, como dizia Saramago, reportando-se à definição antiga de democracia como o governo do povo, para o povo e pelo povo, numa situação em que na democracia está precisamente ausente o povo." Eu diria, à excepção do direito de voto.

Numa situação de crise, as condições de vida tão desejadas por esse povo, tem piorado de dia para dia.

A nível nacional como local assiste-se a uma crescente falta de respeito pelo cidadão. Falta de respeito pelos seus direitos fundamentais. Pelos direitos a que abril abriu as portas.
A única solução encontrada, para já, foi a sugestão do primeiro-ministro convidando à emigração, o que, de algum modo, é um convite ao regresso ao antes do 25 de Abril, mais precisamente aos anos 50 e 60, quando muitos portugueses procuravam no estrangeiro condições que o seu país não queria ou não lhes podia dar.

Essa é a solução apresentada pelo PSD / CDS quando o desemprego aumenta. Aqui, no concelho de Rio Maior voltou a bater um novo record: 974 pessoas, segundo as últimas contas do Instituto do Emprego, relativas ao passado mês de Março.

Em Rio Maior, como no país em geral, o maior grupo entre os novos desempregados é o das pessoas que caíram nesta situação simplesmente por terem chegado ao fim vínculos precários como contratos de trabalho a prazo.

Perante isto, que faz o governo do PSD e do CDS?

Apresenta uma proposta de alteração à legislação laboral que constitui mais um grave retrocesso dos direitos laborais e sociais conquistados com o 25 de Abril. E que virá agravar ainda mais as dificuldades com que se debatem tantos riomaiorenses e tantos portugueses.

O governo do PSD e do CDS pretende tornar mais fácil o despedimento por inadaptação, desregulamentando os horários, introduzindo a possibilidade de imposição do banco de horas nos contratos individuais de trabalho.

As alterações propostas ao regime de protecção social na maternidade, paternidade e adopção contemplam uma alteração da fórmula de cálculo que reduz entre os 14% e os 25% do montante de subsídio a receber, num claro retrocesso que afecta, de forma grave, as famílias mais jovens, não tendo em atenção os problemas que se apresentam na taxa de natalidade do nosso país.

A proposta de alteração que é colocada representa ainda um claro ataque aos sindicatos e à organização sindical dentro das empresas, atacando a contratação colectiva e impondo a negociação com os trabalhadores de contratos individuais, em condições cada vez mais precárias e de perda de direitos.

Existem milhares de jovens com capacidade, formação e experiência de trabalho que se encontram numa situação de desemprego, que atinge, entre os jovens, a taxa de 35,4%.

São mais de 400 mil os trabalhadores que recebem o Salário Mínimo Nacional, sendo na sua maioria jovens e mulheres.

São milhares os trabalhadores, sobretudo jovens, que asseguram o funcionamento das empresas e Serviços, sendo necessários diariamente e tendo, no entanto, um vínculo de trabalho precário.

Entre os trabalhadores com menos de 35 anos, a percentagem de contratos não permanentes em caso de uma nova contratação é de 85%, sendo de 78% no grupo 25-34 anos e de 70% entre os trabalhadores dos 35 aos 54 anos, o grupo que tem a percentagem mais baixa.

A precariedade é uma porta aberta para o desemprego, sendo a grande maioria dos que se inscrevem nos centros de emprego e dos que recorrem ao subsídio de desemprego, trabalhadores que são despedidos por cessação do contrato de trabalho.

Facilitar os despedimentos irá generalizar ainda mais a Precariedade e o desemprego, tornando a relação de trabalho mais frágil e instável e criando uma correlação de forças ainda mais desfavorável aos trabalhadores, sobretudo aos mais jovens.

O aumento e a desregulamentação dos horários de trabalho que afectam, particularmente, os jovens trabalhadores, em situação de trabalho precário, além de criarem entraves ao desenvolvimento de uma vida digna, à constituição de família, ao tempo para o descanso e para a vida pessoal, não são a solução para o crescimento económico, como nos afirmam repetidamente.

As medidas relativas à organização do tempo de trabalho, incluindo a redução do número de feriados e de férias, terão como resultado um aumento efectivo do tempo de trabalho, bem como a redução do valor da remuneração do trabalho suplementar, e podem mesmo destruir postos de trabalho. Com a redução do número de feriados e a eliminação de três dias de férias, as mesmas horas de trabalho podem ser asseguradas com menos 98 mil trabalhadores.

A duração do tempo de trabalho não é um factor determinante na competitividade. Se fosse, o país seria altamente competitivo. Em Portugal, cada trabalhador efectua em cada ano cerca de 48 horas mais que um trabalhador na média da UE e cerca de 76 horas mais que na Alemanha. Os países europeus mais competitivos, segundo a classificação do Fórum Económico Mundial, (Suécia, Finlândia e Alemanha), têm durações de trabalho mais baixas.

Entretanto, o mesmo governo do PSD e do CDS pretende cortar 200 milhões de euros em subsídios de doença e de parentalidade, e no Rendimento Social de Inserção, "para compensar os lucros da EDP de 2011 que «ofereceu» aos novos accionistas chineses".

No final, sobressai o retrato de um Portugal cada vez mais dependente das importações, refém do desemprego e da crise financeira internacional, que abandonou o Estado social e aumentou os impostos sobre o consumo. Numa última imagem, o que resta é um país que agoniza. Um país deprimido e, sempre, um país deprimente no círculo fechado dos negócios e da política.

Não foi para um Portugal assim que se fez o 25 de Abril!

Têm razão os capitães de Abril que dizem:

O contrato social estabelecido na Constituição da República Portuguesa foi rompido pelo poder. As medidas e sacrifícios impostos aos cidadãos portugueses ultrapassaram os limites do suportável. Condições inaceitáveis de segurança e bem estar social atingem a dignidade da pessoa humana.

O rumo político seguido protege os privilégios, agrava a pobreza e a exclusão social, desvaloriza o trabalho.

Sem uma justiça capaz, com dirigentes políticos para quem a ética é palavra vã, Portugal é já o país da União Europeia com maiores desigualdades sociais.

Portugal não tem sido respeitado entre iguais, na construção institucional comum, a União Europeia.

Portugal é tratado com arrogância por poderes externos, o que os nossos governantes aceitam sem protesto e com a auto-satisfação dos subservientes.

O nosso estatuto real é hoje o de um “protectorado”, com dirigentes sem capacidade autónoma de decisão nos nossos destinos.”

Como referia Saramago:

"O que chamamos democracia começa a assemelhar-se tristemente ao pano solene que cobre a urna onde já está apodrecendo o cadáver.

Reinventemos, pois, a democracia antes que seja demasiado tarde."

 * Discurso de Carla Rodrigues na sessão solene da Assembleia Municipal de Rio Maior que celebrou o 38º aniversário do 25 de Abril

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