Carla Rodrigues (foto de Eduardo Barrento) |
Esperava-se
muito da revolução. O povo queria, com todo o direito, melhores
condições de vida e um futuro melhor para os seus filhos e por isso
aderiu de alma e coração aos ideais do Movimento das Forças
Armadas, na esperança de que com novas pessoas e outro sistema
político as coisas evoluíssem no sentido de serem criadas novas
oportunidades, de uma mais justa distribuição da riqueza.
Estamos
hoje, como dizia Saramago, reportando-se à definição antiga de
democracia como o governo do povo, para o povo e pelo povo, numa
situação em que na democracia está precisamente ausente o povo."
Eu diria, à excepção do direito de voto.
Numa
situação de crise, as condições de vida tão desejadas por esse
povo, tem piorado de dia para dia.
A
nível nacional como local assiste-se a uma crescente falta de
respeito pelo cidadão. Falta de respeito pelos seus direitos
fundamentais. Pelos direitos a que abril abriu as portas.
A
única solução encontrada, para já, foi a sugestão do
primeiro-ministro convidando à emigração, o que, de algum modo, é
um convite ao regresso ao antes do 25 de Abril, mais precisamente aos
anos 50 e 60, quando muitos portugueses procuravam no estrangeiro
condições que o seu país não queria ou não lhes podia dar.
Essa
é a solução apresentada pelo PSD / CDS quando o desemprego
aumenta. Aqui, no concelho de Rio Maior voltou a bater um novo
record: 974 pessoas, segundo as últimas contas do Instituto do
Emprego, relativas ao passado mês de Março.
Em
Rio Maior, como no país em geral, o maior grupo entre os novos
desempregados é o das pessoas que caíram nesta situação
simplesmente por terem chegado ao fim vínculos precários como
contratos de trabalho a prazo.
Perante
isto, que faz o governo do PSD e do CDS?
Apresenta
uma proposta de alteração à legislação laboral que constitui
mais um grave retrocesso dos direitos laborais e sociais conquistados
com o 25 de Abril. E que virá agravar ainda mais as dificuldades com
que se debatem tantos riomaiorenses e tantos portugueses.
O
governo do PSD e do CDS pretende tornar mais fácil o despedimento
por inadaptação, desregulamentando os horários, introduzindo a
possibilidade de imposição do banco de horas nos contratos
individuais de trabalho.
As
alterações propostas ao regime de protecção social na
maternidade, paternidade e adopção contemplam uma alteração da
fórmula de cálculo que reduz entre os 14% e os 25% do montante de
subsídio a receber, num claro retrocesso que afecta, de forma grave,
as famílias mais jovens, não tendo em atenção os problemas que se
apresentam na taxa de natalidade do nosso país.
A
proposta de alteração que é colocada representa ainda um claro
ataque aos sindicatos e à organização sindical dentro das
empresas, atacando a contratação colectiva e impondo a negociação
com os trabalhadores de contratos individuais, em condições cada
vez mais precárias e de perda de direitos.
Existem
milhares de jovens com capacidade, formação e experiência de
trabalho que se encontram numa situação de desemprego, que atinge,
entre os jovens, a taxa de 35,4%.
São
mais de 400 mil os trabalhadores que recebem o Salário Mínimo
Nacional, sendo na sua maioria jovens e mulheres.
São
milhares os trabalhadores, sobretudo jovens, que asseguram o
funcionamento das empresas e Serviços, sendo necessários
diariamente e tendo, no entanto, um vínculo de trabalho precário.
Entre
os trabalhadores com menos de 35 anos, a percentagem de contratos não
permanentes em caso de uma nova contratação é de 85%, sendo de 78%
no grupo 25-34 anos e de 70% entre os trabalhadores dos 35 aos 54
anos, o grupo que tem a percentagem mais baixa.
A
precariedade é uma porta aberta para o desemprego, sendo a grande
maioria dos que se inscrevem nos centros de emprego e dos que
recorrem ao subsídio de desemprego, trabalhadores que são
despedidos por cessação do contrato de trabalho.
Facilitar
os despedimentos irá generalizar ainda mais a Precariedade e o
desemprego, tornando a relação de trabalho mais frágil e instável
e criando uma correlação de forças ainda mais desfavorável aos
trabalhadores, sobretudo aos mais jovens.
O
aumento e a desregulamentação dos horários de trabalho que
afectam, particularmente, os jovens trabalhadores, em situação de
trabalho precário, além de criarem entraves ao desenvolvimento de
uma vida digna, à constituição de família, ao tempo para o
descanso e para a vida pessoal, não são a solução para o
crescimento económico, como nos afirmam repetidamente.
As
medidas relativas à organização do tempo de trabalho, incluindo a
redução do número de feriados e de férias, terão como resultado
um aumento efectivo do tempo de trabalho, bem como a redução do
valor da remuneração do trabalho suplementar, e podem mesmo
destruir postos de trabalho. Com a redução do número de feriados e
a eliminação de três dias de férias, as mesmas horas de trabalho
podem ser asseguradas com menos 98 mil trabalhadores.
A
duração do tempo de trabalho não é um factor determinante na
competitividade. Se fosse, o país seria altamente competitivo. Em
Portugal, cada trabalhador efectua em cada ano cerca de 48 horas mais
que um trabalhador na média da UE e cerca de 76 horas mais que na
Alemanha. Os países europeus mais competitivos, segundo a
classificação do Fórum Económico Mundial, (Suécia, Finlândia e
Alemanha), têm durações de trabalho mais baixas.
Entretanto,
o mesmo governo do PSD e do CDS pretende cortar 200 milhões de euros
em subsídios de doença e de parentalidade, e no Rendimento Social
de Inserção, "para compensar os lucros da EDP de 2011 que
«ofereceu» aos novos accionistas chineses".
No
final, sobressai o retrato de um Portugal cada vez mais dependente
das importações, refém do desemprego e da crise financeira
internacional, que abandonou o Estado social e aumentou os impostos
sobre o consumo. Numa última imagem, o que resta é um país que
agoniza. Um país deprimido e, sempre, um país deprimente no círculo
fechado dos negócios e da política.
Não
foi para um Portugal assim que se fez o 25 de Abril!
Têm
razão os capitães de Abril que dizem:
“O
contrato social estabelecido na Constituição da República
Portuguesa foi rompido pelo poder. As medidas e sacrifícios impostos
aos cidadãos portugueses ultrapassaram os limites do suportável.
Condições inaceitáveis de segurança e bem estar social atingem a
dignidade da pessoa humana.
O
rumo político seguido protege os privilégios, agrava a pobreza e a
exclusão social, desvaloriza o trabalho.
Sem
uma justiça capaz, com dirigentes políticos para quem a ética é
palavra vã, Portugal é já o país da União Europeia com maiores
desigualdades sociais.
Portugal
não tem sido respeitado entre iguais, na construção institucional
comum, a União Europeia.
Portugal
é tratado com arrogância por poderes externos, o que os nossos
governantes aceitam sem protesto e com a auto-satisfação dos
subservientes.
O
nosso estatuto real é hoje o de um “protectorado”, com
dirigentes sem capacidade autónoma de decisão nos nossos destinos.”
Como
referia Saramago:
"O
que chamamos democracia começa a assemelhar-se tristemente ao pano
solene que cobre a urna onde já está apodrecendo o cadáver.
Reinventemos,
pois, a democracia antes que seja demasiado tarde."
* Discurso de Carla Rodrigues na sessão solene da Assembleia Municipal de Rio Maior que celebrou o 38º aniversário do 25 de Abril
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