Catarina Martins |
Quatro dias depois, dirigiu ao Secretário de Estado da Cultura a seguinte pergunta:
"Em visita do Grupo Parlamentar do Bloco de Esquerda ao complexo mineiro do Espadanal, no passado dia 10 de Dezembro, foi, lamentavelmente, evidente o abandono a que o complexo está votado e, mais ainda, foi possível constatar a utilização deste património histórico industrial, pela própria Câmara Municipal de Rio Maior, como depósito de resíduos e materiais de construção a céu aberto e sem qualquer vedação, a apenas 50 metros de um estabelecimento de ensino do 1º Ciclo, o Centro Escolar N.º 2 de Rio Maior. A protecção deste importante património é, portanto, da máxima urgência, tanto para evitar a sua completa destruição, como para garantir a segurança pública.
A exploração da Mina do Espadanal, no concelho de Rio Maior, transformou de forma relevante e perene as estruturas demográfica, social, económica, urbana, cultural e desportiva da sede do concelho, particularmente nas décadas de quarenta, cinquenta e sessenta do século XX, contribuindo de forma decisiva para que a então Vila de Rio Maior ganhasse dimensão para atingir o estatuto de cidade que hoje detém.
A importância histórica e arquitectónica do património mineiro do concelho de Rio Maior foi reconhecida em Pareceres emitidos pelo antigo IPPAR, pela antiga Direcção-Geral dos Edifícios e Monumentos Nacionais (DGEMN), e pela Sociedade Espanhola para a Defesa do Património Geológico e Mineiro (SEDPGYM), defendendo de forma unânime a necessidade da sua classificação, e através da inventariação pela Ordem dos Arquitectos no Inquérito à Arquitectura Portuguesa no Século XX (IAPXX).
O “valor simbólico e identitário da fábrica de briquetes para Rio Maior” foi também reconhecido pelo então Ministério da Cultura em resposta a um requerimento de um deputado do Grupo Parlamentar do PCP à Assembleia da República, em Setembro de 2007.
A nível académico, o valor histórico e cultural deste património já foi realçado e fundamentado pelo professor Ivan Carlos Costa, na sua dissertação de Seminário Científico-Pedagógico, no âmbito de Licenciatura em História pela Faculdade de Letras da Universidade de Coimbra, e publicada pelo jornal Região de Rio Maior, em 1999/2000, intitulada “As Minas de Lignite de Rio Maior e sua importância socioeconómica para a região e para o país”, e pelo arquitecto Nuno Alexandre Rocha, na sua tese de Mestrado em Arte, Património e Teoria do Restauro, defendida, em Maio de 2011, na Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa, sob o título “Couto Mineiro do Espadanal (Rio Maior). História, Património, Identidade”.
No dia 8 de Agosto do corrente ano de 2011, foi apresentado pela EICEL 1920, Associação para a Defesa do Património Mineiro, Industrial e Arquitectónico, um pedido de abertura de procedimento administrativo tendo em vista a Classificação do conjunto edificado composto pela antiga fábrica de briquetes e plano inclinado de extracção da Mina do Espadanal, sito em Rio Maior, enquanto Património de Interesse Municipal, nos termos da Lei n.º 107/2001, de 8 de Setembro, e do Decreto-lei n.º 309/2009, de 23 de Outubro. Mas este pedido foi indeferido pela Câmara Municipal de Rio Maior em reunião ordinária realizada a 11 de Novembro de 2011.
Contrariando todos os pareceres existentes, a Câmara Municipal de Rio Maior não procedeu à avaliação dos critérios genéricos de apreciação das formas de protecção legal do património definidos pelo artigo 17º da Lei nº 107/2001, de 8 de Setembro, a saber: “Para a classificação ou a inventariação, em qualquer uma das categorias referidas no artigo 15º (imóveis de interesse nacional, imóveis de interesse público e imóveis de interesse municipal), serão tidos em conta algum ou alguns dos seguintes critérios: a) o carácter matricial do bem; b) o génio do respectivo criador; c) o interesse do bem como testemunho simbólico ou religioso; d) o interesse do bem como testemunho notável de vivências ou factos históricos; o valor estético, técnico ou material intrínseco do bem; f) a concepção arquitectónica, urbanística e paisagística; g) a extensão do bem e o que nela se reflecte do ponto de vista da memória colectiva; h) a importância do bem do ponto de vista da investigação histórica ou científica; i) as circunstâncias susceptíveis de acarretarem diminuição ou perda da perenidade ou da integridade do bem."
Na sua fundamentação do indeferimento, a Câmara Municipal de Rio Maior apresenta interpretação própria do acto de classificação restrita a um único critério de “medida meramente preventiva, quando em presença de uma situação de perigo de perda de um património ou sítio”. Esta interpretação restritiva é inexistente no articulado da Lei nº 107/2001, de 8 de Setembro.
Reunião com a EICEL |
Em declarações à Agência Lusa proferidas no dia 30 de Novembro, a actual presidente da Câmara Municipal de Rio Maior acrescentou que a classificação “não é oportuna neste momento, porque não podemos inviabilizar projectos de alguns proprietários instalados nas imediações”.
Atendendo ao exposto, e ao abrigo das disposições constitucionais e regimentais aplicáveis, o Grupo Parlamentar do Bloco de Esquerda vem por este meio dirigir ao Governo, através do Secretário de Estado da Cultura, as seguintes perguntas:
1. Tem o Governo conhecimento da interpretação que a autarquia de Rio Maior faz sobre a Lei n.º 107/2001, de 8 de Setembro, de que “o início de um processo e posterior classificação de um sítio implica uma série de condicionantes que, regra geral podem constituir mais um entrave que um apoio na gestão do património”, e restringindo a sua aplicação apenas “como medida meramente preventiva, quando em presença de uma situação de perigo de perda de um património ou sítio”? Concorda com esta interpretação?
2. Não considera o Governo que a recusa de classificação de património para protecção de interesses individuais de proprietários privados é incompatível com a Lei n.º 107/2001, de 8 de Setembro, bem como com o exercício da defesa dos interesses de uma comunidade previsto pelo artigo 235º da Constituição da República Portuguesa?
3. Tem o Governo conhecimento que o complexo mineiro do Espadanal está a ser utilizado como depósito de resíduos e materiais de construção?
4. Pondera o Governo, na sequência dos pareceres da tutela do património cultural sobre esta matéria, dialogar com a autarquia de Rio Maior no sentido de encontrar os mecanismos necessários para a salvaguarda e valorização do complexo mineiro do Espadanal?"
Sem comentários:
Enviar um comentário